quinta-feira, 29 de julho de 2010

Arlindo Lamb: "o governador queria ver o diabo, mas não um prefeito do PTB"


Arlindo Lamb, primeiro prefeito eleito de Marechal Rondon, relembra os desafios de sua gestão

Um município inteiro para construir praticamente do zero. Este foi o desafio que Arlindo Alberto Lamb assumiu e cumpriu com determinação, quando se candidatou e assumiu o posto de primeiro prefeito eleito do então recém criado município de Marechal Cândido Rondon. Antes dele, por nomeação do governador Moisés Lupion, Ari Branco da Rosa havia sido nomeado chefe do Poder Executivo Municipal, cargo que ocupou por pouco mais de cinco meses (de 05/08/1960 a 25/01/1961), até ser destituído por Ney Braga, que recém havia assumido o governo do Paraná.

Nascido em 16 de julho de 1921, em Marques de Souza (RS), Arlindo chegou a Marechal Cândido Rondon em 26 de maio de 1955, onde atuou como empresário e agricultor. Logo se envolveu também na política e em 1956, juntamente com Helmuth Koch (PSD) e Simão Scherer (UDN), Arlindo foi eleito vereador para representar a então vila General Rondon na Câmara de Toledo, em cuja legislatura chegou a assumir a presidência do Legislativo por dois anos.

Com a destituição de Ari Branco da Rosa, novas eleições foram marcadas para o dia 08 de outubro de 1961. Lideranças da comunidade, além do próprio administrador da colonizadora Maripá, Willy Barth, convenceram Arlindo a se candidatar. Filiado ao PTB, concorreu coligado com o PL. O outro candidato a prefeito era o farmacêutico Frederico Goebel, da UDN, que havia formado coligação com o PDC.

Arlindo recorda que, por ser a primeira eleição do município, todos os candidatos a vereadores eram praticamente inexperientes, no que diz respeito ao processo eleitoral. Mas, a motivação era grande. Segundo ele, “os comícios, na verdade, eram reuniões nas comunidades. Alguns candidatos a vereador decoravam pequenos discursos”, recorda.

A vitória de Arlindo Lamb foi tranquila, somando 2.374 votos contra 735. A coligação dele também elegeu a maioria dos vereadores: Helmuth Priesnitz, Harri Pydd, Teobaldo Loffi, Erno Greef, Aldo Alievi e Lindolfo Nienkoetter, todos do PTB; e Rainoldo Wengrat, do PL. Pela oposição elegeram-se Aílson Confúcio de Lima e Luiz Groff.

Posse

A posse aconteceu 2 de dezembro de 1961, no antigo Salão Weiss, e foi coordenada pelo juiz Vilson Balão, da 75ª Zona Eleitoral, de Toledo. Após a posse, o prefeito convidou a comunidade a visitar a prefeitura, que iria funcionar no antigo escritório da colonizadora Maripá, que havia sido doado por Willy Barth ao municíoio. Arlindo conta que Erich Ritscher, um dos três primeiros pioneiros de Marechal Cândido Rondon, se mostrou surpreso que até cofre a prefeitura já possuía, no que o novo prefeito respondeu: “cofre nós temos, mas não temos dinheiro”.

Então, Ritscher tirou uma nota de dinheiro da carteira e depositou em uma gaveta, gesto que foi repetido por outras pessoas. Conforme Arlindo, no primeiro dia que a prefeitura funcionou, graças a esse gesto da população a municipalidade tinha dinheiro em caixa, que foi registrado como doações espontâneas para a instalação do município.

“Praticamente não havia cobranças. O pessoal se contentava com tudo. Queriam escolas e estradas. Eu atendia todo mundo. Podia vir de pé-de-chinelo ou descalço, não tinha cerimônia. Queria falar com o prefeito, entrava direto e falava”, explica Arlindo Lamb sobre o seu método de trabalho.

Os primeiros funcionários da prefeitura, nomeados pelo prefeito, foram: Osvino Lemke, secretário; Henrique Afonso Sturm, tesoureiro; Werner Wanderer, fiscal; Rubem Luersen, contador; Lindolfo Garmatz, fiscal de estradas; e Valdomiro Liessen, inspetor de ensino.

Estradas


Na época em que o primeiro prefeito eleito assumiu a prefeitura, cerca de 80% do município ainda era coberto pela floresta nativa e a demanda por infraestrutura era enorme. É preciso lembrar ainda que Marechal Rondon contava então com as áreas que hoje formam os municípios de Quatro Pontes, Mercedes, Pato Bragado, Entre Rios do Oeste, São José das Palmeiras e também São Clemente e Sub-Sede, atualmente distritos de Santa Helena.

Arlindo recorda ainda que depois da lei estadual de emancipação de Marechal Cândido Rondon, Toledo praticamente abandonou o seu antigo distrito. “Não arrumou estradas e não fez mais nada. Nossas estradas estavam a zero”, afirma. Surgia então um dos primeiros desafios da nova administração, que era adquirir máquinas para manter e abrir novas estradas.

Arlindo viajou até Curitiba, na Paraná Equipamentos. Mas, como a prefeitura não tinha recursos, o prefeito tirou dinheiro do próprio bolso e deu a entrada para compra de uma moto-niveladora, que teria que ser paga em três parcelas. “Quando cheguei foi aquela festa. Na área onde está instalado o posto Esso foi montada uma recepção com foguetes e uma caixa de cerveja”, lembra o ex-prefeito, que informa que o mesmo aconteceu com a compra de um trator de esteira.

Pontes

A construção de pontes também era prioridade. Na gestão de Arlindo foram construídas várias sobre os rios Facão Torto, Arroio Marrecos, Arroio Fundo, Branco, entre outras. A que mais chamou a atenção foi a ponte sobre o Rio São Francisco, entre os distritos de Entre Rios do Oeste e Pato Bragado. Com 74 metros de extensão, foi inaugurada em abril de 1964.

A obra, bastante cara, recebeu recursos do governo federal e moradores também contribuíram com a doação de madeira. Os recursos do governo federal somavam 8, 6 milhões em moeda corrente na época, que foram depositados no Banco do Brasil, em Foz do Iguaçu. Era uma quantia bem considerável e Arlindo trouxe todo esse dinheiro em dois sacos escondidos na carroceria de sua caminhonete. O dinheiro ficou guardado na casa do próprio prefeito, que conforme era necessário, ia fazendo os pagamentos. Além de Arlindo, somente a sua esposa, o secretário e o tesoureiro da prefeitura sabiam onde ele se encontrava.

Infelizmente, a ponte acabou praticamente destruída em uma grande enchente ocorrida na região em 1973 e teve que se reconstruída.

Educação

Assim como a abertura de estradas, o ensino estava em primeiro plano na administração de Arlindo. Segundo ele, logo que assumiu moradores de Entre Rios do Oeste vieram à prefeitura solicitar a construção de uma escola, para atender inicialmente apenas 10 alunos. Pensando à longo prazo, Arlindo acertadamente decidiu pela construção. Muitas famílias do Rio Grande do Sul e Santa Catarina já tinham adquirido as terras na localidade, mas não haviam se mudado pela falta de escola.

Esse educandário foi uma das primeiras obras do governo de Arlindo, que assumiu em dezembro de 1961 e no mês seguinte deu início a construção, que foi concluída em fevereiro, para atender aquelas 10 estudantes. “Em julho, já havia 40 alunos. No fim do ano, eram 80. Assim se repetiu em outras regiões do município”, destaca o ex-prefeito, que ao final de sua gestão havia instalado 66 escolas.

Governador

Nos primeiros anos, o novo município contava com o apoio do deputado estadual Luis Alberto Dall’Canalle nas reivindicações junto ao governo do Paraná, que na época tinha Ney Braga com governador. Arlindo lembra que a relação dele com o governador “era ótima. Eu visitava o Palácio do Governo para reivindicar alguma coisa e o governador era muito amável, batia nas costas, falava ‘como vai este ilustre prefeito’. Mas, ele não gostava do PTB. Ele queria ver o diabo, mas não um prefeito do PTB. Ele simplesmente prometia, mas não cumpria nada. Durante o mandato do governador Ney Braga eu não consegui nada. Eu conseguia alguma coisa do Estado através das secretarias.”

Apesar desse contratempo, a gestão de Arlindo Lamb é marcada pelo grande número de obras realizadas e conquistas alcançadas, como a implantação dos primeiros 100 telefones de discagem direta do município. Outra ação importante realizada naquela gestão foi o encaminhamento para a criação do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae), implantado em 1966, durante o mandato de Werner Wanderer, que era vice-prefeito na primeira gestão e foi eleito prefeito com o apoio de Arlindo Lamb.

“Francamente, me orgulho de ter sido o primeiro prefeito eleito de Marechal Cândido Rondon”, afirma Arlindo, 89 anos completados no último dia 16. “É um orgulho estar vivo e participar dos festejos de 50 anos. Nós tivemos muito bons prefeitos e alguns que saíram um pouco fora do que devia ser feito. Mas Rondon progrediu. É um município bom de morar, de muito futuro”, finaliza.

LEGENDA: Arlindo Lamb, à direita, no dia de sua posse como prefeito, em 1961.

CRÉDITO: Arquivo particular de Arilindo Alberto Lamb


Arlindo Alberto Lamb: uma história que merece ser contada

“A ideia de retratar a vida de Arlindo Arlindo Lamb veio a partir de um desafio de amigos, após assistir a inúmeras pequenas palestras do próprio Arlindo. Pelo fato de Arlindo Lamb ter uma história muito rica, guardada até então somente na sua memória, decidi encarar o desafio e colocar no papel a sua biografia, por entender que era uma história que merecia ser contada.

O objetivo do livro foi não permitir que os detalhes da rica história de Arlindo Lamb se perdessem, até porque a sua história se confunde muitas vezes com a história do próprio município e de organizações como a Copagril, o Saae e a Rádio Difusora.

O livro foi além dos fatos oficiais e apresenta aspectos curiosos, inusitados e até divertidos, por vezes completamente desconhecidos pela maioria das pessoas.

O livro, lançado em 2006, foi também o meu trabalho de conclusão do curso de Comunicação Social – Jornalismo e, para que ele acontecesse, obtive o apoio e o suporte de vários professores da faculdade, bem como me foi exigido estudos teóricos acerca de como se procede o resgate de memórias, cuja finalidade maior é impedir que as lembranças se percam no tempo. As pessoas passam, mas suas memórias ficam.”


Jadir Zimmermann
Jornalista


(Cristiano Viteck, O Presente - 50 anos de Marechal Cândido Rondon _ JULHO/2010)

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