sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Divagações sobre J. D. Salinger


“O homem imaturo é aquele que quer morrer gloriosamente por uma causa. O homem maduro contenta-se em viver humildemente por ela.”
J. D. Salinger

“O Apanhador no Campo de Centeio”, de J. D. Salinger é um romance obrigatório, que deveria ser lido por todos os estudantes do ensino fundamental. Nada de José de Alencar e aqueles escritores chatos que matam para sempre a vontade de ler dos alunoss. Adolescente não quer saber de Iracema, a virgem dos lábios de mel. Adolescente quer é se identificar com alguém que passe pelos mesmos problemas que os dele, que sinta o mesmo vazio, que tenha a mesma vontade de experimentar, de amar o novo, de odiar o velho. Adolescente quer ser como Holden Caulfield, o personagem principal de “O Apanhador no Campo de Centeio”.

Li o livro pela primeira vez em 1999, quando já estava com 21 anos. A obra era difícil de achar, já que a editora que o publica no Brasil é bem pequena. Quem me passou o livro, fotocopiado, foi meu amigo Glauco. Leitura imediata. Comecei à noite e no outro dia de manhã tinha terminado. Numa tacada só. Outro livro que tenha me atraído tanto assim, que eu me lembre, só “On The Road”, de Jack Kerouac. Mas aí já é outra história...

“O Apanhador no Campo de Centeio” conta alguns dias da vida de Holden Caulfield que, expulso da escola nas vésperas do Natal, perambula por Nova York por alguns dias antes de ir para casa contar aos pais o que havia acontecido. Bebe, fuma, encontra os amigos, perambula sem rumo, curte a noite... E no meio de tudo isso, vai construindo uma imagem bem negativa do mundo adulto. Contando assim parece banal. Mas, experimente ler... Não é à toa que o livro, publicado em 1951 e um sucesso de venda, foi considerado um dos eventos responsáveis pela construção do conceito de “adolescente” que nós temos hoje em dia, o qual ganhou força e se firmou a partir da década de 1950. "O Apanhador no Campo de Centeio" causa uma minirrevolução.

Pois, bem. O escritor J. D. Salinger morreu ontem, de causas naturais, aos 91 anos de idade. A repercussão da sua morte é imensa em todo mundo. Mesmo não tendo publicado nada de novo há mais de 40 anos, esse norte-americano é lembrado como um dos maiores escritores do século XX. Recluso, era avesso a entrevistas. A última que concedeu foi em 1980. Também não se deixava fotografar. Escreveu pouco. Além de “O Apanhador no Campo de Centeio”, publicou apenas alguns conto e outros três livros, entre eles o também elogiado “Franny e Zooey”, no qual consta aquilo que considero a melhor e mais bela definição já feita sobre o que vem a ser Deus.

Mesmo vivendo isolado, sem querer J. D. Salinger fazia muito barulho. Quando Mark Chapman foi preso depois de matar John Lennon, no dia 8 de dezembro de 1980, ele segurava nas mãos um exemplar de “O Apanhador no Campo de Centeio”. Justificou o assassinato dizendo ter encontrado mensagens na obra que o incitavam a matar o ex-beatle. No dia 30 de abril de 1981, o presidente dos Estados Unidos Ronald Reagen foi vítima de um atentado. O atirador se disse inspirado também pelo livro.

Mas “O Apanhador no Campo de Centeio” não tem nada a ver com morte. Pelo contrário, é sobre a vida. O famoso publicitário brasileiro Washington Olivetto disse certa vez que tem sempre vários exemplares do livro em casa, com os quais costuma presentear os amigos. Outro ilustre apaixonado pela obra é o escritor Luis Fernando Veríssimo. Em um texto que escreveu, decifrou o enigma da atração de “O Apanhador no Campo de Centeio”:

“Pois o livro é sobre o que todos nós fomos na adolescência, revoltados incompreendidos, nos achando melhores do que os adultos porque ainda não éramos ridículos como eles, e sobre a maior banalidade de todas, a protobanalidade que embala boa parte da arte humana: a perda da inocência da infância, a sua corrupção pela vida. Se o leitor também é um jovem, não identifica a banalidade, ou a toma como uma sacada e se encanta com ela”.

Um escritor ímpar, J. D. Salinger se foi, mas a sua obra está aí, pronta para despertar o Holden Caulfield que existe em cada um de nós. Quem se aventurar, não vai se arrepender...

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